De todas as formas de oração, há uma que se caracteriza particularmente por um profundo movimento meditativo. Littré definiu a contemplação como uma das “meditações mais elevadas que chegam ao ponto de cortar comunicação do espírito e do corpo com as coisas sensíveis.”. A meditação tem como chave o parar. Contemplar, por sua vez, supõe levar o corpo, o espírito e a alma em uma forma de meditação, com o objetivo de se aproximar o máximo possível de Deus. Se ele corresponde à última fase da lectio divina, a contemplação é igualmente uma forma de oração à parte. A Igreja Católica estima que “a contemplação é necessária na vida de todo cristão para que sua ação reflita o amor de Deus.” Mas o que é concretamente a contemplação? E como realizá-la?
A exemplo de Maria, sentemo-nos aos pés de Deus e ocupemo-nos para não nos deixarmos submergir pela agitação, como Marta. “Maria escolheu a melhor parte”: nós também, uma vez que nos decidimos por contemplar a Deus, escolhemos a melhor parte. Aproveitemo-nos disso. Além da agitação física, é da agitação do espírito que precisamos nos desfazer.
Como em toda oração meditativa, é conveniente iniciar a oração fazendo um momento de silêncio interior. Como um mar agitado, deixemos que nosso interior se acalme. Deixemos nossa Marta interior vir sentar-se junto à Maria para contemplar Jesus em silêncio. As impurezas do mar concentram-se ao fundo para deixar no superior uma água clara e transparente, como nosso espírito torna-se aberto ao sentir a presença de Deus em nós. Para isso, centralizemos nossa atenção em nós mesmos a fim de encontrar a Deus.
“Assim no santuário te busquei, para contemplar teu poder e tua glória.” (Sl 62, 3). Uma vez que entramos na contemplação, podemos pedir ao Senhor a graça de ver sua força e sua glória.
Deus se revela a nós por meio de Seu Filho Jesus Cristo. Para contemplar a Deus, tem melhor suporte que a Bíblia? Uma vez que nos sentamos para contemplar a Deus, podemos nos apoiar nas Santas Escrituras. Contemplamos Sua glória por meio dos Evangelhos, lemos e repetimos suas palavras, admiramos seus gestos. Enfim, encontramos toda nossa atenção em Jesus e Suas diferentes manifestações: Suas palavras, Seus atos, Seus ensinamentos, mas também Sua presença real na Eucaristia.
Nossos pensamentos inevitavelmente irão se desviar. É necessário, portanto, estar atento a fim de retornar toda nossa atenção continuamente a Deus, e distanciar todo pensamento que não tenha ligação com Ele. A contemplação não é um exercício de concentração, mas um exercício de amor. Se todo nosso ser se volta para o amor de Jesus, oferecendo a Ele todo o amor que temos, então nossos pensamentos se desviarão menos e nossa contemplação portará frutos.
Não nos esqueçamos, em nossos momentos de contemplação, de que não estamos sós. Nunca estamos sós. Se decidimos contemplar a Deus, lembremo-nos de que Ele está ali à nossa espera, antes mesmo de irmos até Ele. Ele está presente e nos contempla, nos olha com amor. Lembrar-se disso é enriquecer nossa própria contemplação.
Santo Inácio de Loyola propõe, nos exercícios espirituais, uma forma de contemplar a Deus por meio das Escrituras. Trata-se de, após a leitura de uma passagem bíblica, adentrar nela por meio da imaginação. Convém passar pelo crivo dos seus sentidos cada aspecto da passagem. A visão, claro: visualizamos a passagem como se víssemos um filme. Também a audição: o que dizem as personagens, quais são os barulhos ao redor desse acontecimento. O tato: quais as sensações físicas, está quente ou frio, o vento toca a pele, a areia entra nas sandálias etc. O olfato e o paladar: quais serão eles nesse ambiente?
Depois de passar um momento imerso em uma cena da vida de Jesus e observado tudo o que se passa e a forma como Jesus se comporta, podemos tentar reler nossa vida quotidiana ou um episódio de nossa vida em particular. Comportamo-nos como Jesus teria se comportado? Somos a imagem e semelhança de Jesus tanto quanto possível? Essa releitura permite iluminar nossas fraquezas e erros e nos encoraja a tomar consciência dos progressos que fizemos. Levantamo-nos em seguida, prontos para agir melhor e à imagem de Jesus Cristo.
No dia a dia, basta abrir os olhos para que possamos contemplar a glória de Deus. Para que melhor manifestação de Deus do que Sua própria criação? Portanto, contemplamos a Deus uma vez que olhamos para os nossos próximos: Deus vive neles assim como vive em cada um de nós. Olhando para os outros, vemos a Deus.
Alarguemos nosso horizonte e observemos – de acordo com o lugar em que vivemos – as árvores, os rios, as frutas e os legumes, as montanhas, o mar ou o interior, observemos as flores e os campos, o céu e as estrelas, o Sol e a Lua, a chuva, o arco-íris e as nuvens. Tudo isso é uma manifestação impregnada em nossas vidas: estejamos conscientes disso uma vez que observamos ao nosso redor. Deus se manifesta em nossa volta e deixa-se ver por nós em todo seu esplendor. Saibamos ver e contemplar aquilo que Ele nos oferece.
Inspirados na contemplação e nos exercícios espirituais de Santo Inácio de Loyola, participe no Retiro sete dias de oração para viver o silêncio. Partindo do livro A pedagogia do silêncio, de Eder Vasconcelos, este retiro tem como objetivo conduzir seus participantes para uma experiência de intimidade com Deus.
Não deixe de participar!